O "Lobo Solitário" (Mangá): A Saga de Itto Ogami....

O "Submundo" Apresenta.... Mais uma matéria especialíssima escrita por um novo colaborador do blog: Roberto Xavier - que fala aqui sobre o seu mangá favorito: "Lobo Solitário"!

A bela e violenta saga de Itto Ogami e seu filho Daigoro.... Rendeu uma das maiores obras-primas dos mangás (e das HQs em geral) em 28 edições (já publicadas no Brasil). Produzida originalmente entre 1970-1976, a série foi também adaptada pro cinema (e está disponível em DVD)!

Confira abaixo a matéria completa:
 

    

Imagine você tendo que descrever sobre a sua obra preferida número 1 das HQs! Agora some a isso o desafio de não deixar fugir nenhum detalhe importante, não mandar spoilers, não parecer impressionado demais e ainda ser sua primeira contribuição no seu canal favorito de quadrinhos na internet! Imaginou? Então agora você estará preparado para ler essa matéria e me desculpar se algo faltou ou ficou além da sua expectativa. De tudo o que li até hoje em relação à HQs, e isso significa quase três décadas, nada me impressionou tanto quanto duas obras: Watchmen e Lobo Solitário. Watchmen foi aquela obra que me fez refletir e amadurecer como leitor. E até hoje ainda faz com que a cada nova leitura surjam novos detalhes, como se tivessem sido escondidos de propósito. Me espanta a sincronia entre todos os acontecimentos e personagens, pensar que alguém há trinta anos planejou escrever uma história nos seus mínimos detalhes e direcioná-la para leitores de quadrinhos e praticamente chutá-los de sua zona de conforto, desconstruindo personagens e valores até então intocáveis, impressiona até hoje. Bruxo! rs.

Talvez Lobo Solitário não tenha o mesmo “impacto psicológico” causado pela obra de Alan Moore, mas também causa um impacto, ao avesso de tudo o que até então havia sido a leitura de quadrinhos para mim, começando pela ausência de superpoderes, desenhos em P&B e imagens que muitas vezes falam por si sem a necessidade de um texto, também impressiona, e muito. Sem contar que assim como Watchmen, Lobo Solitário surpreende a cada nova releitura. Admito que nunca soube diferenciar os vários estilos de mangás (Shoujo, Shounen, Seinen etc), inclusive para esta matéria nem perdi tempo com isso, porque pra mim o que interessa mesmo é uma boa história, de preferência bem desenhada, escrita e com personagens cativantes, e Lobo Solitário representa tudo isso. E digo, sem medo de errar, que Lobo Solitário é o melhor mangá já publicado no Brasil. 

O título de Kazuo Koike e Goseki Kojima, teve várias “encarnações” em editoras como a Cedibra e Nova Sampa, precedendo em quase 20 anos a “maldição de Preacher”, de série com dificuldade de ser concluída no Brasil, até ser publicada na integra pela editora Panini nos anos 2000. Na Cedibra, Lobo Solitário foi publicado em formato americano e durou nove edições, enquanto na Nova Sampa foi publicada no formato 13,5 cm x 19 cm um pouco mais alto do que o tradicional formatinho. Foi na Nova Sampa que o título perdurou por mais tempo, tendo passado por duas “reestruturações” que reiniciaram os números e alguns almanaques esporádicos. Algumas características em comuns entre as duas editoras eram o formato que obedecia as capas da licenciadora nos EUA, Dark Horse, com capas de Frank Miller, Bill Sienkiewicz e Matt Wagner, e as histórias fora de ordem. Lobo Solitário é uma obra admirada por artistas como Frank Miller que fez questão de desenhar muitas das capas das edições americanas e admite que seu Ronin é carregado de influências desse mangá!

Lobo Solitário foi criado por Kazuo Koike (roteiro) e Goseki Kojima (desenhos) no início da década de 70. As histórias se passam no período Edo (Tokugawa) na história do Japão, 1603 a 1868. No período retratado temos Itto Ogami, o executor oficial do governo, também conhecido como kaishakunin, uma espécie de carrasco incumbido pelas execuções de daimyos (senhores feudais) que haviam cometido algum crime contra Xogunato Tokugawa (governo). O cargo de kaishakunin ocupado pelo Clã-Ogami era motivo de cobiça por outro Clã, o da família Yagyu, que arma uma conspiração para destituir Itto do cargo, incriminando-o por blasfêmia e traição. Itto Ogami tem sua esposa morta e apenas com o filho pequeno é obrigado a cometer seppuku, espécie de suicídio honroso. Mas, momentos antes da execução Ogami descobre que o Clã-Yagyu está por trás de tudo e consegue fugir com o filho com a promessa de vingança. A saga de Itto Ogami e sua busca por vingança se estende por vários anos dentro da história, enquanto passa vagando pelo Japão. É incrível como notamos a passagem dos anos com o entrar das estações que se repetem e o desenvolvimento do filho Daigoro, que passa por transformações físicas e várias provações, privações e sacrifícios por causa da promessa de vingança do pai. 

A história de Lobo Solitário se mantém em alta qualidade durante grande parte da trama e são várias subtramas que surgem sem que o foco principal se perca. A arte de Kojima é tão impressionante que em alguns capítulos as histórias são contadas sem a necessidade de textos. Inclusive as lutas retratadas pelo artista são históricas, de uma violência e beleza fora do comum, bem como a retratação do período, os povoados, as pessoas, hábitos e conflitos sociais. Sei que diante de tantos títulos lançados sobre samurais, ronins, espadas, torneios e lutas para alguns pode até parecer saturado esse tipo de história, mas, Lobo Solitário é referência para praticamente todas as que vieram depois e não envelheceu em importância e qualidade depois de mais de quatro décadas. Em Lobo Solitário há muitos momentos de luta, mas também de ternura e reflexão. A procura de um homem por vingança a qualquer custo, sem se importar com as consequências, ou envolver o filho nesse caminho é algo que surpreende nessa obra. A determinação é tudo. 

Depois de várias tentativas Lobo Solitário finalmente foi concluído na íntegra em 28 volumes pela editora Panini em 2007. A edição da Panini é excelente, possui glossários no final das edições com significados de termos japoneses, contextualizações históricas, mapas do Japão Feudal e várias outras informações pertinentes as histórias. Kazuo Koike (o roteirista) além de Lobo Solitário e Samurai Executor, publicado pela Panini em 8 volumes, ambos em parceria com Goseki Kojima também tem outras obras famosas publicadas no Brasil, Yuki: Vingança na neve (Conrad) e Crying Freeman (Panini). Lobo Solitário foi levado aos cinemas no Japão durante a década de 70 pelo diretor Kenji Misumi com colaboração de Kazuo, foram 6 filmes bem fieis ao mangá. O último foi lançado em 1974, um ano antes da morte do diretor Misumi, com a HQ ainda em curso, e, em consequência disso, a série de filmes foi privada de um desfecho. No Brasil esses filmes foram lançado em um box com 3 DVDs (capa acima)!

Até+

PS: O "Submundo" agradece a estreia e participação do Roberto Xavier no cast estelar de colaboradores do blog, rs... E torce pra que a saga do "Lobo Solitário" seja republicada de novo no Brasil! E a seguir: Mais uma colaboração especial (pra comemorar o Dia das Crianças em grande estilo)!!!